Por Antonio de Oliveira Lima
Um dos
aspectos a ser considerado para compreender as barreiras culturais na luta
contra o trabalho infantil é fato de que, durante a maior parte da história de
nosso país, a exploração do trabalho da criança e adolescente encontrava
amparo na própria legislação. No período de 1967 a 1988, por exemplo, a legislação brasileira permitiu o trabalho a
partir dos 12 anos de idade, representando um retrocesso em relação ao período
de 1934 a 1966, quando o trabalho somente era permitido a partir dos 14 anos.
Voltando um
pouco na linha do tempo, vamos verificar que de 1500 a 1891 as crianças e
adolescentes brasileiras não contavam com qualquer dispositivo legal para
protegê-las contra a exploração no trabalho. As Constituições Brasileiras de
1824 e 1891 não se referiram expressamente à criança e ao adolescente, tampouco
ao trabalho infantil1.
A
Constituição de 1934 foi a primeira a tratar expressamente da proteção à
infância e à juventude e estabelecer uma idade mínima para o trabalho. O artigo
121 consagrou, além de outros direitos mais favoráveis aos trabalhadores, a
proibição de qualquer trabalho para os menores de 14 anos; de trabalho noturno
para os menores de 16 anos; e de trabalho em indústrias insalubres para menores
de 18 anos. As Constituições de 1937 e de 1946 mantiveram as mesmas disposições
sobre proibição do trabalho infantil,
porém, em 1967, o Regime Militar outorgou uma Carta Política,
substituindo a Constituição de 1946, estabelecendo, dentre outras medidas de
retrocesso dos direitos sociais, a redução da idade mínima para o trabalho, de
14 para 12 anos. Somente com a
Constituição de 1988 a idade mínima para o trabalho voltou a ser de 14 anos de
idade, passando para 16 anos em 1998,
com a Emenda Constitucional nº 20.
No plano
internacional, a Convenção nº 138 da
OIT, aprovada em 1973, estabeleceu que os países deveriam seguir “uma política
nacional que assegurasse a efetiva abolição do trabalho infantil e elevasse
progressivamente, a idade mínima de admissão a emprego ou a trabalho a um nível
adequado ao pleno desenvolvimento físico e mental do adolescente”. Ocorre que,
nessa época, conforme já dito acima, o
Brasil admitia o trabalho a partir dos 12 anos de idade. Em 1988, com a
promulgação da atual Constituição Federal, esse limite foi ampliado para 14
anos. Somente em 1998, com a Emenda Constitucional nº 20, foi que o Brasil
alcançou o padrão internacional em termos de legislativa proibitiva do trabalho
infantil. Em apenas 10 anos, a idade mínima para o trabalho no Brasil passou de
12 para 16 anos.
Essas
mudanças, ocorridas no mundo legal, ainda não se concretizaram. Muitas pessoas ainda não conseguiram
compreender a importância da luta contra o trabalho infantil. Os brasileiros
nascidos até a década de 1980 vivenciaram a sua infância sobre vigência do
antigo “Código de Menores”. Essa lei não concebia a criança e adolescente como
sujeitos de direitos, não lhes assegurava proteção integral e prioridade
absoluta, nem respeitava a sua condição de pessoa em desenvolvimento. Isso
explica, em parte, porque muitos dos atuais adultos acreditam que o trabalho
infantil não é um problema: a legislação muda de um dia para o outro, mas a
cultura leva anos para mudar.
1
No âmbito infraconstitucional, o Decreto 1.313, de 1891, editado por Teodoro da
Fonseca, que disciplinava o trabalho do “menor” na fábrica do Distrito Federal,
o Decreto Municipal 1.801, de 1917, sobre proteção do “menor” no Rio de Janeiro
e o Decreto16.300, de 1923, com vedação ao trabalho dos menores de 18 anos por
mais de 6 horas a cada 24 horas, foram os primeiros diplomas a tratarem do
trabalho do “menor”[1],
Nenhum comentário:
Postar um comentário