quarta-feira, 28 de dezembro de 2016

Tragédia



Acordamos às 4:00h, já não era necessário um despertador, parecia que lá dentro de nossa cabeça havia um relógio que às quatro horas em ponto, começava a gritar: “Vamos...acorde para trabalhar”. Levantei, chamei meu irmão Augusto. Era necessário chamá-lo, pois o coitado só tinha 8 anos e precisava trabalhar. Meu nome é Bianca, tenho 10 anos.  Nós trabalhamos, pois, meus pais não conseguem sustentar a casa sozinhos. Peguei minhas roupas e a de Augustinho dentro de uma caixa que ficava no chão, não tínhamos guarda-roupa, isso é coisa “chique”.
Saímos correndo, já imaginando a cara fechada do turmeiro, nos esperando com uma bronca daquelas. Ao entrar no ônibus ficávamos a pensar nos nossos sonhos de ir para escola, poder brincar, ter amigos... meus pensamentos foram interrompidos pelos gritos do motorista dizendo: “chegamos pessoal”!
Descemos do ônibus, meus pais foram para o lado mais denso do canavial, eu e meu irmão continuamos onde havíamos parado. Não sei explicar, mas, estava com um pressentimento de que algo ruim, iria acontecer. De repente meus pensamentos foram interrompidos pelos gritos do Augustinho, que por uma fatalidade, ao cortar uma cana acertou o pulso com o facão. Comecei a gritar por socorro, o turmeiro demorou a chegar, meu irmão sangrava muito. Quando ele chegou entramos no carro e passamos onde meus pais estavam para irmos ao hospital. Porém, como ele já havia perdido muito sangue, não resistiu e morreu no meio do caminho. Minha mãe chorava e gritava, meu pai tentava consolá-la mas víamos que ele estava desesperado.
O enterro foi na manhã seguinte. Naquela noite, fiquei imaginando quantas crianças já deviam ter morrido no corte de cana...  Pensava também, nos momentos felizes com meu irmão... Com lágrimas nos olhos adormeci, triste por não poder fazer nada para mudar aquela situação.
Acordei com o barulho de uma conversa na sala. Era o Conselho Tutelar que havia sido informado do acontecido. Eles convenceram meus pais a me matricular em uma escola. Meus pais conseguiram outro trabalho e minha mãe passou a receber o bolsa família. Ainda estamos pobres mas lutamos por uma vida mais digna. Estou me dedicando aos estudos para quem sabe, no futuro, conseguir ter uma vida melhor.
Sabe o motivo de eu estar contando minha história a vocês? Peço sua ajuda. O mundo pode melhorar sabia? O trabalho infantil afeta o desenvolvimento físico, emocional e social da criança. Denuncie ao Conselho Tutelar ou a autoridades responsáveis.

Conto do Município de Ipameri-GO
2º lugar no Prêmio MPT na Escola 2016

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