PROGRAMA DE
EDUCAÇÃO CONTRA A EXPLORAÇÃO DO TRABALHO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE
PETECA
1.
ESCOPO DO PROJETO
Trata-se
de um programa de educação que visa conscientizar a sociedade para a
erradicação do trabalho infantil. Consiste num conjunto de ações voltadas para
a promoção de debates nas escolas de ensino fundamental e médio, dos temas
relativos aos direitos da criança e do adolescente, especialmente o trabalho
infantil e a profissionalização do adolescente.
Lançado
em 2008, no Ceará, o programa contou a participação inicial de 51 municípios
cearenses. Porém, a cada ano vem ganhando novas adesões, tendo chegado a 135 municípios em 2018. Em 2009 a experiência foi
expandida aos demais estados brasileiros, através do Projeto MPT na Escola, que
atualmente corresponde ao eixo Educação do Projeto Resgate a Infancia, do
Ministério Público do Trabalho (MPT).
O
programa se operacionaliza por meio de oficinas de capacitação e sensibilização de
profissionais da educação, que atuam como coordenadores municipais do Programa
e são responsáveis pela formação de coordenadores pedagógicos. Estes, por sua
vez, debatem com os professores os temas estudados nas oficinas, elaborando
plano de ação para abordagem em sala de aula e promovem eventos nas escolas,
ampliando o debate para toda a comunidade escolar.
Além
do trabalho de conscientização, em muitos municípios, vem sendo realizadas
pesquisas para conhecer a realidade dos alunos que trabalham. Após a pesquisa,
a Assistência Social e demais órgãos e entidades da rede de proteção realizam a
busca ativa e a inclusão social das crianças e adolescentes encontrados em
situação de trabalho.
Em
2018 o projeto foi executado em 1978 escolas de 135 municípios cearenses,
contemplando 17.197 professores e 379.145 mil alunos.
O
Peteca tem ajudado a reduzir o trabalho infantil no Ceara. Em 2008, quando o
programa foi lançado, havia 293 mil crianças e adolescentes em situação de
trabalho no Estado. Em 2016, o número de trabalhadores precoce no Ceará caiu
para 85 mil. A redução foi de 70%.
2.
JUSTIFICATIVA
A Pesquisa Nacional por
Amostra de Domicílios – PNAD, realizada, anualmente, pelo Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística – IBGE, tem demonstrado que, apesar da gradativa
redução, ainda é grande o número de crianças e adolescentes em situação de trabalho
no Brasil, especialmente na agricultura familiar, no trabalho doméstico e nas
atividades informais urbanas. Nesses tipos de atividade a atuação dos órgãos de
fiscalização é bastante limitada, sendo mais eficazes as ações de prevenção,
como políticas públicas de atendimento à criança e ao adolescente e
conscientização da sociedade.
Um dos
fatores que dificultam a erradicação do trabalho infantil no Brasil é o fato de
que parte da sociedade ainda não concebe o trabalho precoce como um problema
social. Muitas pessoas que defendem o trabalho precoce por acreditar que,
diante da falta de políticas públicas, deve-se permitir que crianças e
adolescentes ajudem a complementar a renda das famílias que se encontram em
situação de vulnerabilidade social; outros
justificam a prática como um meio de ocupar a criança e o adolescente, evitando
que se “marginalizem”. Além dessas, muitas outras justificativas são apontadas
pelos que toleram o trabalho infantil. São em chamados mitos do trabalho
infantil, que se manifestam em frase de senso comum, que contam com grande
aceitação popular, tais como “é melhor trabalhar do roubar ou ficar na rua”,
“trabalhar não matar ninguém, eu trabalhei e não morri”, dentre outras.
Em 1988, o
nosso Ordenamento Jurídico abraçou a doutrina da proteção integral (CF, art.
227), passando a conceber a criança e o adolescente enquanto sujeitos de
direitos. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), aprovado em 1990,
também consagrou essa doutrina. Abandonou-se, assim, a chamada doutrina da
“situação irregular”, que orientava a legislação até então vigente.
O ECA, além
de prescrever os direitos da criança e do adolescente, criou mecanismos para a
sua efetivação. Do referido estatuto, extraiu-se o que se convencionou chamar
de Sistema de Garantia de Direitos, consistente no conjunto de instrumentos,
mecanismos e estratégias postos à disposição das pessoas, dos órgãos e
entidades, do poder público e da sociedade civil, com atribuições legais para a
efetivação dos direitos da criança e do adolescente.
Esses 28
anos, porém, não foram suficientes para que a sociedade passasse a conceber a
criança e adolescente como sujeitos de direito. Ainda não se conseguiu destruir
todos os mitos construídos ao longo dos anos em que vigorou a
doutrina da “situação irregular”. Alguns desses mitos permeiam, ainda hoje, o
imaginário popular e funcionam como barreiras culturais, que dificultam a
efetivação dos direitos da criança e adolescente.
Diante desse contexto,
resta evidente que a erradicação do trabalho infantil perpassa por um processo
constante de conscientização da sociedade. Para esse processo, a melhor
estratégia é investir na formação dos futuros cidadãos, tornando-os conscientes
e comprometidos com uma sociedade sem exploração de crianças e adolescentes.
Nessa missão, a escola é o caminho mais adequado.
Dentre os
atores do Sistema de Garantia de Direitos, os educadores ocupam situação de
destaque, por serem os profissionais que mais estão presentes no dia-a-dia da
criança e do adolescente. Os profissionais da assistência social lidam com os
que se encontram em situação de vulnerabilidade social; os profissionais da
saúde lidam com os que estão com a saúde vulnerável; os profissionais da
educação, entretanto, lidam, todos os dias, com todas as crianças e
adolescentes, independentemente da classe social.
Por outro lado, os educadores são os profissionais que possuem as melhores
condições de identificar os casos de trabalho infantil, pois, na maioria das
vezes, o trabalho precoce é a principal causa do baixo rendimento ou do
abandono escolar. Acrescente-se, ainda, que os dados do IBGE apontam que cerca
de 80% das crianças e adolescentes que trabalham estão matriculadas, fator que
favorece a identificação e busca ativa dessas crianças, bem como sua inclusão
nos serviços de convivência e fortalecimento de vínculos da assistência social.
A escola
pode e deve colaborar com a prevenção do trabalho infantil. Para isso se faz
necessário capacitar e sensibilizar professores, coordenadores e demais profissionais
da educação para que atuem como multiplicadores, promovendo debates com os
alunos e os pais, para romper as barreiras culturais que dificultam a
efetivação dos direitos da criança e do adolescente.
3.
CENÁRIO
Mundo. O trabalho infantil é um problema
social que ainda afeta milhões de crianças e adolescentes no Brasil e no mundo.
De acordo com os dados divulgados pela Organização Internacional do Trabalho
(OIT), ainda existiam em 2013 cerca de 215 milhões de crianças e adolescentes
exploradas no trabalho precoce no mundo, sendo que mais da metade desses
trabalhadores infantis estão nas chamadas piores formas de trabalho infantil. Na
América Latina e Caribe o trabalho precoce atinge cerca 12,5 milhões de
crianças e adolescentes em 2014, segundo a OIT.
Brasil. Apesar da redução verificada nos últimos anos,
a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), realizada pelo IBGE em
2014, apontou a existência de cerca 3,3 milhões de crianças e adolescentes de 5 a 17 anos em situação de trabalho, o que
equivale a 8,1% do total de crianças e adolescentes existentes nessa faixa
etária, naquele ano. A distribuição por faixas etárias indicam que 83% do
trabalho infantil acontece na idade de 14 a 17 anos, principalmente entre os 16
e 17 anos (58%).
Regiões. Analisando a distribuição por
grandes regiões geográficas, observa-se que o Nordeste responde por 33% desse
total, seguido pelo Sudeste (30%), Sul (16%), Norte (12% ) e Centro-Oeste (8%).
Entretanto, quando se analisa o grau de incidência, isto é, o percentual de
trabalho infantil, percebe-se que os maiores índices de trabalho infantil estão
nas Regiões Sul (10,23%) e Norte (9,24), e o menor índice é o da Região Sudeste
(6,55%). As regiões Centro Oeste (8,21%) e Nordeste (8,67) aparecem com índices
intermediários.
Estados e DF. Entre
as unidades da Federação o Estado do Piauí foi o que apresentou o maior índice (16%),
seguido dos Estados de Santa Catarina (11,6%), Maranhão (11,4%), Rio Grande do
Sul (10,7%), Pará (10,7%) e Sergipe (10,4%), todos com percentual de duas casas
decimais. Em nível nacional o IBGE constatou o percentual de 8,1%.
Alerta. Entre 2013 e 2014 o IBGE constatou aumento do
trabalho infantil no Brasil, em todas as faixas etárias, passando de: a) 61 mil
para 70 mil, na faixa etária de 5 a 9 anos; 446 mil para 484 mil entre que
tinham entre 10 a 13 anos; d) 807 mil para 852 mil entre os adolescentes de 14
e 15 anos, e: d) 1,875 milhão para 1,926 milhão entre os adolescentes de 16 e
17 anos. Das 27 Unidades de Federação,
houve aumento em 17 Estados e no Distrito Federal. Apenas nos Estados de Minas
Gerais, Rio Grande do Sul, Ceará, Goiás, Pernambuco, Rio de Janeiro, Rio Grande
do Norte, Rondônia e Tocantins registraram redução. Em todo o país, o número de
crianças e adolescentes em situação de trabalho cresceu 4,5% em 2014, na
comparação com 2013 (143 mil).
Características.
De acordo com a PNAD 2014, 63% das crianças e adolescentes que trabalham são
meninos. No quesito gênero, a pesquisa constatou que 65,5% são meninos, porem
no trabalho doméstico 94% são meninas. Quanto ao local, 69,2% declararam que
trabalham nas cidades, porém, dos 30,8% que que trabalham no campo, 62% tem
menos de 14 anos. Quanto a remuneração, 74,9% são remuneradas e 25,1% não
recebem contraprestação. Já no quesito educação, 80% estudam, porém na faixa
etária de 16 e 17 anos, onde se concentra 57% do trabalho infantil, o índice de
frequência à escola era de apenas 71,8%.
Piores formas.
Além da quantidade e do grau de incidência, outro aspecto que preocupa é o das
condições de trabalho a que estão submetidos os trabalhadores infantis. Muitas
crianças exercem atividades proibidas
até mesmo para os adultos, como a
exploração sexual, o tráfico de drogas, o trabalho análogo ao de
escravo, dentre outras atividades ilícitas[1]. Um grande contingente
dos pequenos trabalhadores realizam atividades insalubres e perigosas, a
exemplo do trabalho nas ruas, lixões, pedreiras, carvoarias, dentre outras
atividades exercidas em condições degradantes. Mais de 90% dos adolescentes que
trabalham não tem carteira assinada, e cerca de 25% estão fora da escola, pois
não consegue conciliar a exaustiva jornada de trabalho com as atividades
escolares.
4.
DOS OBJETIVOS
São
objetivos do Peteca
1.
Gerais:
a)
Intensificar o processo de conscientização da sociedade com
vistas à erradicação do trabalho infantil e à proteção ao trabalhador
adolescente;
b)
Romper as barreiras culturais que dificultam a efetivação
dos direitos da criança e do adolescente;
c)
Fortalecer o Sistema de
Garantia de Direitos, com vistas à ampliação, quantitativa e qualitativa, das
políticas públicas de atendimento à criança e ao adolescente.
2.
Específicos:
a)
Estabelecer parcerias entre o Ministério Publico do
Trabalho e as Secretarias de Educação com vistas à inclusão dos temas relativos
aos direitos e deveres da criança e do adolescente na proposta pedagógica e no
currículo das escolas de ensino fundamental;
b)
Capacitar e sensibilizar professores, coordenadores pedagógicos e demais
profissionais do ensino fundamental para que atuem como multiplicadores no
processo de conscientização dos alunos, da comunidade escolar e da sociedade em geral, com vistas à erradicação
do trabalho infantil e à proteção ao trabalhador adolescente;
c)
Distribuir material de apoio pedagógico sobre a erradicação
do trabalho infantil e proteção ao trabalhador adolescente para as escolas do
ensino fundamental;
d)
Realizar debates, em sala de aula, sobre o Estatuto da
Criança e do Adolescente, enfatizando a erradicação do trabalho infantil e a
proteção ao trabalhador adolescente;
e)
Realizar palestras nas escolas com vistas à conscientização
dos pais para que não explorem nem tolerem a exploração de crianças e
adolescentes;
f) Incentivar os alunos a
realizarem tarefas escolares sobre os direitos da criança e do adolescente,
enfocando atitudes de efetivação e prevenção da violação desses direitos;
g)
Promover eventos para divulgação dos trabalhos produzidos
pelos alunos;
h)
Realizar pesquisa para identificar os casos de trabalho
infantil existentes no território da escola;
i) Contribuir com as ações
intersetoriais de mobilização, identificação e busca ativa de crianças e
adolescentes em situação de trabalho;
j) Envolver a comunidade
escolar e a sociedade em geral em campanhas, programas, projetos e ações de
prevenção e erradicação do trabalho infantil.
5.
DA METODOLOGIA
Na
execução do Peteca, aplica-se a metodologia da multiplicação do saber.
Inicialmente serão capacitados Técnicos das Secretarias Municipais para atuar
como Coordenadores Municipais do Programa; depois serão capacitados os
Diretores, Coordenadores Pedagógicos e Professores, que atuarão como
multiplicadores, repassando as orientações Pedagógicas aos demais educadores
das respectivas escolas, e estes, por sua vez, farão a abordagem dos temas
propostos para os Alunos, incentivando-os a realizarem trabalhos literários e
culturais sobre os temas abordados.
6.
DAS ATRIBUIÇÕES E RESPONSABILIDADES
I - Do MPT
1.
Realizar a Oficina
de Formação dos Coordenadores Municipais do Programa;
2. Fornecer o material de apoio pedagógico sobre o
tema Trabalho Infantil;
3. Articular parcerias junto aos demais atores do
Sistema de Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente, para participarem
do Programa nos respectivos Municípios.
4. Acompanhar e avaliar a execução do Programa.
As atribuições do MPT serão exercidas pelas
Coordenadorias Regionais de Combate à Exploração do Trabalho da Criança e do
Adolescente (Coordinfância nos Estados).
II– do Município
1.
Designar
Técnico(a) de Educação da área pedagógica, para
atuar como Coordenador(a) Municipal do Programa, proporcionando-lhe
todos os meios necessários para a execução do projeto, presente Acordo e no
Plano de Ação;
2.
Informar as
escolas que participarão do Programa, proporcionando-lhes todos os meios
necessários à realização das atividades previstas no presente Acordo e no Plano
de Ação;
3.
Encaminhar ao MPT
relatório, fotos e/ou imagens de todas as atividades do Programa, realizadas no
âmbito do município.
As atribuições do Município serão exercidas
pela Secretaria Municipal de Educação (SME)
7.
PLANO DE AÇÃO
O Peteca será realizado com base em Plano de
Ação, elaborado pela Secretaria Municipal de Educação, contemplando, dentre
outras, as seguintes atividades:
a)
Oficina Municipal – realizada pela SME, para formação dos
Diretores, Coordenadores Pedagógicos e Professores e/ou planejamento de
atividades do Projeto.
b)
Planos Escolares – elaborados pelas escolas participantes,
contendo as atividades do projeto que serão realizadas no ano letivo.
c)
Planos de Aula – elaborados pelos professores, para
abordagem do tema trabalho infantil em sala de aula;
d)
Produção de Tarefas – trabalhos literários e culturais sobre
os temas objeto do projeto, realizados pelos alunos
e)
Avaliação das Tarefas – realização de eventos nas escolas e
na SME, para apresentação e divulgação dos trabalhos produzidos pelos alunos,
os quais poderão ser selecionados e inscritos no Prêmio Peteca, observado o
regulamento do referido Prêmio.
f) Ações intersetoriais –
campanhas, reuniões, seminários e demais atividades realizadas em parceria com
as demais Secretarias, órgãos e entidades do Sistema de Garantia de Direitos da
Criança e do Adolescente.
g)
Cronograma – calendário das atividades que serão realizadas
ao longo do ano letivo.
8.
DOS RECURSOS
A parceria entre o MPT e os Municípios,
órgãos ou entidades não implicarão
transferência de recursos financeiros entre os referidos entes públicos. Cada
partícipe será responsável pela aplicação dos seus próprios recursos,
alocando-os para o cumprimento dos objetivos deste instrumento, conforme a
necessidade e disponibilidade.
Antonio de
Oliveira Lima
Procurador do Trabalho
Idealizador e Coordenador Geral do Peteca
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