quinta-feira, 1 de novembro de 2012

TRABALHO INFANTIL E O VÔLEI NO BRASIL

O jornal Hoje em Dia, de Belo Horizonte-MG, publicou, nesta quinta-feira (1º/11/2012), matéria sobre a situação dos adolescentes do Centro de Treinamento de Saquarema, conhecido como  “a casa do voleibol brasileiro”. De acordo com a referida matéria, adolescentes de 13 a 17  estão sendo privados do direito à educação, e muitos chegam a perder o ano letivo por passarem cerca de dois a quatro meses em treinos, sem frequentar a escola. São adolescentes bem sucedidos nas quadras, porém reprovados nos bancos escolares.

A matéria destaca que o Aryzão, apelido do Centro de Treinamento,  recebe  cerca de 90 atletas, que passam de dois a quatro meses morando e treinando nas  suas dependências. Apesar de  grande e confortável, o Aryzão não conta com espaços educacionais.

“São 108 mil metros quadrados, em frente à praia, com 211 leitos de hotelaria, quatro quadras indoor e quatro de vôlei de praia, 800 metros de área de musculação e fisioterapia, duas salas de hidromassagem, consultórios médicos com alta tecnologia, além de restaurante, museu do vôlei, barcos, estacionamento, auditório, sauna, piscinas, quadras de tênis e campo de futebol”.

De acordo com a matéria, o jornal entrevistou adolescentes e dirigentes, cujas declaraões evidenciam negligência por Confederação Brasileira de Vôlei, que não faz o acompanhamento educacional dos adolescentes recebidos pelo Centro de Treinamento. “São eles que têm que se adaptar: o esporte com as atividades escolares. Eles têm que correr atrás quando voltam às suas casas”, admitiu o ex-técnico e atual gerente de Seleções da Confederação, Antônio Rizola.

No outro ponto da reportagem, o Jornal destaca o exemplo da Confederação Brasileira de Basquete (CBB), que assegura a matrícula escolar,  além da hospedagem, alimentação e assistência necessária, durante os cerca de seis que meses que os adolescentes permanecem no Centro de Treinamento e Desenvolvimento da Base do Basquete Brasileiro, que funciona  no Município de São Sebastião do Paraíso, no Sudoeste de Minas. “Temos um acordo com a CBB e asseguramos a vaga na escola pública a todos os inscritos no projeto. Eles chegam já com tudo resolvido e encaminhado”, declarou o secretário de Esportes do município, Mariano Bícego, acrescentando que é obrigatório estar matriculado no devido ano escolar para poder integrar a seleção de desenvolvimento.

A Constituição Federal (art. 227) e o  Estatuto da Criança e do Adolescente (Eca) estabelecem que os direitos fundamentais das criança e ao adolescente devem ser assegurados pela família, a sociedade e o Estado, com prioridade absoluta, dentre os quais a edcuação e esporte.  Tais direitos devem ser exercidos em harmonia. Assim, são absolutamente inadmissíveis práticas esportivas que impeçam crianças e adolescentes de frequentarem a escola.

O art.  53 do Eca estabelece que “a criança e o adolescente têm direito à educação, visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho”.  Já o art. 71 do referido Estatuto prescreve que “a criança e o adolescente têm direito a informação, cultura, lazer, esportes, diversões, espetáculos e produtos e serviços que respeitem sua condição peculiar de pessoa em desenvolvimento”.

Em razão da sua condição peculiar de pessoas em desenvolvimento crianças e adolescentes tem direito à práticas desportivas em condições que não prejudiquem os demais direitos, dentre os quais o da educação.

O desporto brasileiro abrange práticas formais e não-formais e obedece às normas gerais da Lei nº 9615/96, a chamada “Lei Pelé.  Um dos princípios do desporto, previsto na referida lei, é o da educação, que deve ser voltado para o desenvolvimento integral do homem como ser autônomo e participante, e fomentado por meio da prioridade dos recursos públicos ao desporto educacional. A Lei Pelé prevê três modalidade de práticas desportivas: educacional, de participação e de rendimento.

Os fatos acima relatados referem-se a prática esportiva de alto rendimento e, como tal, deve obedecer a regras gerais da supracitada lei, dentro outras “regras de prática desportiva, nacionais e internacionais, com a finalidade de obter resultados e integrar pessoas e comunidades do País e estas com as de outras nações” (art. 3º, inciso III). Cabível, por analogia, as disposições legais impostas às entidades formadoras de atleta previstas no  art. 29 da mesma lei. O inciso II do referido dispositivo prevê, nas alíneas “c”, “f” e “i” as seguintes obrigações:

c) garantir assistência educacional, psicológica, médica e odontológica, assim como alimentação, transporte e convivência familiar”
f) ajustar o tempo destinado à efetiva atividade de formação do atleta, não superior a 4 (quatro) horas por dia, aos horários do currículo escolar ou de curso profissionalizante, além de propiciar-lhe a matrícula escolar, com exigência de frequência e satisfatório aproveitamento;
i) garantir que o período de seleção não coincida com os horários escolares.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) estabelece, em seu art. 4º, que o  dever do Estado com educação escolar pública será efetivado mediante a garantia de:

I - ensino fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele não tiveram acesso na idade própria;
II - progressiva extensão da obrigatoriedade e gratuidade ao ensino médio;

X – vaga na escola pública de educação infantil ou de ensino fundamental mais próxima de sua residência a toda criança a partir do dia em que completar 4 (quatro) anos de idade.

 Por fim, é oportuno invocar também o  art. 5º da LBD, segundo o qual  “o acesso ao ensino fundamental é direito público subjetivo, podendo qualquer cidadão, grupo de cidadãos, associação comunitária, organização sindical, entidade de classe ou outra legalmente constituída, e, ainda, o Ministério Público, acionar o Poder Público para exigi-lo”.

Lei a reportagem a que se refere este artigo aqui

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