O Conselho Nacional dos Direitos da
Criança e do Adolescente – CONANDA, órgão colegiado de caráter deliberativo e
controlador das ações de promoção, proteção e defesa dos direitos da criança e
do adolescente, integrante da estrutura básica da Presidência da República,
previsto no art. 88 da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 - Estatuto da
Criança e do Adolescente, criado pela Lei nº 8.242, de 12 de outubro de 1991 e
regulamentado pelo Decreto nº 9.579, de 22 de novembro de 2018, vem a público
para se manifestar acerca do filme ‘Como Se Tornar o Pior Aluno da Escola’.
Considerando as competências do
Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, conforme disposto
em seu Regimento Interno, Resolução 217/2018, no art. 3º, especialmente nos
incisos V e XIX, de “promover e apoiar campanhas educativas sobre os direitos
da criança e do adolescente, com indicação de medidas a serem adotadas nos
casos de atentados ou violação desses direitos”, bem como de “emitir
resoluções, notas públicas e recomendações relacionadas a temática dos direitos
das crianças e dos adolescentes”.
Considerando os princípios da
prioridade da criança e do adolescente e da proteção integral, nos termos do
art. 4º, Lei 8.069/90 (ECA), o qual estabelece que “É dever da família, da
comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta
prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à
alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura,
à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária”.
Considerando o art. 5º, do referido
Estatuto da Criança e do Adolescente, o qual dispõe que “nenhuma criança ou
adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação,
exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer
atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais”.
Considerando que se tratam esses de preceitos
constitucionais, conforme disposto art. 227, CF/88: “É dever da família, da
sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta
prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à
profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à
convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de
negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”.
Considerando a cena do filme
longa-metragem ‘Como Se Tornar o Pior Aluno da Escola’, que suscitou grande
debate social neste último mês de março em todo o Brasil, em que personagem
adulto propõe a dois adolescentes situação que configura violência sexual e
crime previsto na legislação penal brasileira.
Considerando o art. 240, do ECA, Lei
8069/1990, que tipifica o crime de “produzir, reproduzir, dirigir, fotografar,
filmar ou registrar, por qualquer meio, cena de sexo explícito ou pornográfica,
envolvendo criança ou adolescente” com pena de reclusão de 4 a 8 anos e multa;
bem como o art. 241E, o qual dispõe que “para efeito dos crimes previstos nesta
Lei, a expressão ‘cena de sexo explícito ou pornográfica’ compreende qualquer
situação que envolva criança ou adolescente em atividades sexuais explícitas,
reais ou simuladas [...]”.
Considerando a longa luta deste
Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente contra o abuso
sexual de crianças e adolescentes, e que em seus 30 anos de atuação, o CONANDA
seguiu firme em sua missão de garantir que os direitos de crianças e
adolescentes, em qualquer contexto, sejam observados e respeitados, em especial
aqueles dispostos na Constituição e no Estatuto da Criança e do
Adolescente.
Considerando ofício recebido por este
Conselho por parte do legislativo federal, bem como da Sociedade Brasileira de
Pediatria, que solicita especial atenção deste Conselho Nacional de Direitos da
Criança e do Adolescente, na pessoa de seu Presidente, no sentido de buscar
entendimentos institucionais para a urgente revisão dos critérios de
classificação indicativa para produtos audiovisuais no País, em que aproveita
para expressar ser veemente contra censura e a favor da
liberdade de expressão, mas que repudia qualquer iniciativa que, mesmo de forma
não proposital, incite ou faça apologia de atos de pedofilia.
Considerando, por fim, alerta
encaminhado ao CONANDA emitido também pela Sociedade Brasileira de Pediatria,
em que reforça ser contra censura e a favor da liberdade de expressão,
asseverando, no entanto, que a defesa de princípios sobre os quais está
ancorada a democracia não pode e nem deve justificar a divulgação de conteúdo
inadequado, que banaliza atos que ofendem crianças e adolescentes, deixando-os
em situação de vulnerabilidade.
Diante das
considerações acima, o CONANDA manifesta-se no seguinte sentido:
1. Que sejam adotadas as medidas
cabíveis para reavaliação pelo órgão competente, de forma que o Ministério da
Justiça e Segurança Pública, através da Comissão de Classificação Indicativa,
proceda com a revisão permanente de obras já classificadas, em atenção à
classificação dos filmes em razão do conteúdo e dos temas abordados.
2. Sejam amplamente discutidos os
instrumentos legais de educação, para formação e compreensão do público que
alcança os canais abertos ou não, possibilitando a formação e prevenção de
todos os tipos de violência, sobretudo, a violência sexual praticada contra
crianças e adolescentes, inclusive com possibilidade de campanha educativa para
pais e responsáveis quanto à importância de se observar a classificação
indicativa para a proteção da saúde mental e social de adolescentes e
crianças.
3. Sejam promovidos debates, encontros e
confecção de cartilhas explicativas sobre conteúdos que possam contribuir para
a relevância do tema, além de tratar da prevenção e defesa de crianças e
adolescentes, pondo-os a salvo desse tipo de violência.
4. Seja destacado que existem dados
comprovando que a violência sexual contra crianças e adolescentes é uma triste
realidade presente na sociedade brasileira. Apenas entre 2017 e 2020, foram
registrados 179.277 casos de estupro com vítimas de até 19 anos – uma média de
quase 45 mil casos por ano. Inclusive, crianças de até 10 anos representam 62
mil das vítimas nesse período. (Fonte: Unicef e Fórum Brasileiro de Segurança
Pública).
5. Seja observado que esse tema não deve
ser tratado em tom de humor e forma de exploração a título de piadas, o que
consequentemente não educa ou informa sobre os riscos a serem enfrentados pelas
crianças e adolescentes expostos aos riscos, sobretudo os que se apresentam
pelos meios de comunicação e tecnológico.
6. Seja destacado que a arte
cinematográfica pode trazer contribuição ao retratar o tema, chamando atenção
para sua prevenção, propiciando que crianças e adolescentes possam reconhecer
situações de abuso e violência sexual de modo a se proteger e denunciar os
casos; no entanto, esse papel precisa ser feito com o devido cuidado e
responsabilidade, sem incorrer no risco de exposição de crianças e adolescentes
a situações que ferem a legislação brasileira quanto aos princípios da
prioridade e da proteção integral.
7. Seja reforçado junto às Varas
Especializadas para que, quando da autorização para a participação artística de
crianças e adolescentes em espetáculos públicos e/ou programas congêneres, além
de todos os elementos listados no artigo 149, inciso II do ECA, deverá levar em
conta, especialmente, os princípios da Lei n. 8069/1990, a adequação do
ambiente a eventual participação ou frequência de crianças e adolescentes e a
natureza do espetáculo ou programa equivalente.
8. O Conselho Nacional de Direitos da
Criança e do Adolescente é contra qualquer forma de censura, ressaltando que a
liberdade de expressão artística deve ser exercida com responsabilidade, em
especial evitando a exposição de crianças e adolescentes em situações
constrangedoras ou degradantes que as coloquem em posição de vulnerabilidade,
em observância ao disposto no artigo 17 do Estatuto da Criança e do
Adolescente, que lhes garante o direito ao respeito com a preservação da
imagem, da identidade e da autonomia, além de outros elementos;
9. Que o Ministério Público Federal
avalie eventual ocorrência de crime previsto na legislação penal pertinente.
10. O Conanda reitera a importância da elaboração, execução e monitoramento de planos e políticas públicas de prevenção e enfrentamento à violência sexual contra crianças e de adolescentes, por todos os entes federativos.
Brasília, 24 de março de 2022.
DIEGO BEZERRA ALVES
Presidente do Conselho
Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente
Nenhum comentário:
Postar um comentário